sexta-feira, 31 de agosto de 2012

CAFFÈ GILLI - o Luxo tem um Apetite Insaciável



Dia desses, estava eu na tradicionalíssima Confeitaria Colombo, elegante estabelecimento no centro do Rio de Janeiro, devorando algumas torradas Petrópolis enquanto tagarelava entre amigos. Foi quando um deles, tomado por um repentino orgulho de ser carioca, exclamou em alto e bom som: "esta casa é ímpar. Já rodei parte do mundo e jamais vi algo igual."

Refleti por alguns minutos para chegar à conclusão de que havia uma certa veracidade naquela afirmação: nossa Colombo é um deleite visual e gastronômico. Não obstante, em minhas raras andanças ao redor do globo, em especial pela Itália, achei-me em instituições que, apesar de serem representantes de estilos arquitetônicos e artísticos diversos ao presente na Colombo, eram igualmente embasbacantes. Dentre elas, sobressaem-se o histórico Caffè Florian, na Pizza San Marco, em Venezia, local escolhido por Charles Dickens e Rousseau; o imponente e suntuoso Antico Caffè Greco, na Via Condotti, a rua mais "cara" de Roma; e o adorável, distinto e incrivelmente aconchegante Caffè Gilli, no Berço do Renascimento, a inesquecível Firenze.



Meu destaque, neste post, é precisamente este último. Comecemos, então, com um pouco de história:

Em 1733, na Firenze de Gian Gastone de' Medici, a família suíça Gilli abre, na Via de' Calzaiuoli, em pleno centro histórico da cidade, uma pequena cafeteria chamada La Bottega dei Pani Dolci. A casa fez sucesso instantâneo, tendo inclusive como clientes assíduos alguns integrantes da nobreza florentina.

No início do século passado, finalmente se muda, já com o atual nome, para sua presente localização, na Piazza della Repubblica, então conhecida como Piazza Vittorio Emanuele.

Durante o período do Futurismo, Gilli é frequentado por intelectuais e escritores e torna-se local de discursos políticos inflamados. Passa a ser ponto de encontro de artistas e pintores do calibre de Doni, Caligani, Pozzi e Pucci.

Com o término da 2ª Grande Guerra, a casa faz-se, também, um reduto objeto de desejo para jovens e turistas. Hoje, tal como naquela época, esta cafeteria de dois séculos e meio de idade, possui uma freguesia eclética, formada por simples "peregrinos" curiosos até cidadãos pomposos e notáveis.



Ao ingressar na casa,  meus olhos, primeiramente, pararam no bar com sua bancada de mármore verde malaquita. Ao fundo, garrafas de whiskys, licores e outras bebidas alcólicas fazem a decoração desta ala. Pode-se ver, ainda, inúmeras cafeteiras atrás de um punhado de esmerados baristas portando trajes irrepreensíveis, e que demonstram incrível coordenação e organização no momento de atender às solicitações das muitas mesas do Gilli.



Próximo à entrada, há um fascinante mostruário, exibindo garbosamente alguns dos mais belos doces em que já pus meus olhos: são crostate di fragole, bignés com chantilly, cannoli açucarados e crocantes, profiteroles entupidos de creme e regados com ganache de chocolate dentre muitos outros. Imaginem como eu, com meu espírito de gordo, senti-me ao defrontar com essas pequenas obras de arte.


Anexo ao bar, encontra-se o salão principal da casa. Seu estilo Liberty é rebuscado, com paredes marfim, arcos, lustres feitos de vidro Murano e teto com afrescos. Aqui, passei algumas jornadas, geralmente na hora do poente, para aquecer-me junto aos termosifoni, bebericando uma cioccolata calda e degustando um ou dois tramezzini.

Como infelizmente não me lembrei de tirar fotos, cabe-me explicar que tramezzino é um tipo de sanduíche que pode ser encontrado em toda a Itália. Deve seu nome ao dramaturgo, escritor e intelectual Gabriele D'Annunzio, que uniu duas palavras italianas, tra e mezzo, as quais, traduzidas para o português, significam, respectivamente, entre e meio, ou seja, é feito com pão quadrado e recheado pelos mais variados sabores. Simples, não?

No Gilli, particularmente, os seus preços são um tanto quanto inflacionados (algo em torno dos  8). Na verdade, é evidente que, dada sua história, não estou tratando de um café econômico. Exemplo disto é o expresso da casa, que custa  4, quando em outros estabelecimentos do país, pode ser comprado pela quarta parte deste valor.

Ainda assim, aconselho-os: não deixem de conhecer o Gilli. Vocês certamente terão maior dispêndio lá do que em outros cafés de Firenze, contudo renegá-lo seria o equivalente a um estrangeiro, de férias no Rio de Janeiro, optar por não ir à nossa magnífica Confeitaria Colombo.

ENDEREÇO:
Via Roma, 1R, Firenze
Horários: todos os dias, exceto às terças, das 8h às 24h (nos meses de novembro a fevereiro, fecha às 21h)
Tel. +39 055 213896
http://www.gilli.it/

domingo, 19 de agosto de 2012

ESPECIAL - Melhores Vinhos de Marche



Tenho muito apreço pelo bom gosto do Deus Bacco, afinal partilhamos da mesma atração pelo vinho. E, quando o assunto é esta bebida alcólica, obtida a partir da fermentação do sumo da uva, a Itália surge, na atualidade, como seu maior produtor e exportador no mundo. Para se ter uma idéia,  trata-se do país que nos apresentou obras-primas como o Barolo, o Barbaresco, o Brunello de Montalcino e o Amarone della Valpolicella. Em outras palavras, é a Meca para todos os amantes da bebida dos deuses.

Ao notarmos o eterno casamento entre o italiano e o vinho, jamais poderíamos supor que esta história por pouco deixou de ser trágica, uma vez que, por vários anos, desde 1862, a uva esteve próxima de sumir completamente do país.

No final do século XIX, 80% da população da Itália vivia direta ou indiretamente da produção do vinho e presenciou o desaparecimento da maior parte de seus vinhedos e de suas castas. Nesta época, toda Europa foi infestada pela praga filoxela, proveniente da América, que, por ser até então desconhecida do meio-ambiente europeu, provocou seu desequilíbrio, enfraquecendo as videiras e produzindo um suco intragável e propenso a doenças.

Em vinte e cinco anos, foram três as pragas que destruíram as parreiras européias e, na tentativa de encontrar uma vide resistente à elas, os métodos de vinicultura foram modificados para sempre. Como forma de remediação, adotaram-se porta-enxertos oriundos de cepas americanas, já resistentes aos danos da filoxela. Funcionou, a praga foi erradicada! E com isso, os atuais vinhos italianos, à exceção daqueles vindos das ilhas da Sicilia e Sardegna, têm ascendência americana.



Uma das situações mais prazeirosas quando se viaja para o exterior, é participar de um intercâmbio de informações culturais. Simples prosas, porém verdadeiras aulas. Deste modo, Roberto Frifrì, enólogo e chef do restaurante Noè, em Camerino, agraciou-me com fatos que até então eu desconhecia inteiramente.

O primeiro, curiosíssimo, é que a única forma de apuração do sabor do vinho é na ocasião em que o mesmo ainda se encontra nos silos de aço ou, então, dentro dos enormes barris de carvalho, bem antes do fabricante engarrafá-lo e colocá-lo à venda no mercado.

Em que isto é importante? Simples. Talvez muitos de vocês comprem determinado vinho e esperem um sem-número de anos para consumi-lo, com o intuito de se utilizarem desta passagem do tempo para aperfeiçoar seu sabor. É balela! Quando muito, o vinho bem conservado não perderá suas características originais, mas jamais aprimorará seu gosto.

Para desvelar a informação seguinte, Roberto indagou minha opinião acerca dos vinhos chilenos. Prontamente respondi-lhe que alguns estão, possivelmente, entre os melhores do mundo. Satisfeito com minha resposta, Roberto revelou-me que não somente os vinhos originários do Chile, mas de diversas partes do mundo, durante seu processo de fabricação, recebem açúcares e componentes químicos para equipararem-se, quando necessário, às safras anteriores bem sucedidas, deixando a bebida com gosto linear, agradável ao consumidor. Isto é, contudo, terminantemente vedado por lei na Itália, onde é feito rigoroso controle de produção, não sendo relevante se a safra anual foi pouco proveitosa ou se o tempo foi pérfido.



A propósito, a foto acima mostra o próprio Roberto Frifrì em nossa visita ao Borgo Paglianetto, uma cantina na cidade marchegiana de Matelica, cujo vinho, denominado Verdicchio, é considerado um dos mais nobres representantes da uva branca em todo o país.

Aqui, tomarei como base minhas experiências práticas e meus conhecimentos na matéria, embora confesse que sejam bastante acanhados, para dar-lhes algumas indicações dos melhores vinhos pertencentes à região de Marche. Fiquem tranquilos, somente direi minhas breves impressões, pois não tenho a menor pretensão em ser um "enochato".



Verdicchio DOC - já que lhe fiz menção, comecemos, por conseguinte, com este vinho histórico. De tonalidade amarelo-esverdeada, é produzido em duas regiões de Marche: Castelli di Jesi (província de Ancona) e a já citada Matelica (província de Macerata).

Em minha excursão ao Borgo Paglianetto, aprendi que o microclima do vale Sinclinale Camerte, território de produção do Verdicchio di Matelica, é ideal para o cultivo de uvas. Este local é particular, por ser o único vale de Marche posicionado do Norte para o Sul, protegido pela barreira de San Vicino (1.479 metros) a leste e pelos Monti Sibilini ao sul. A ótima exposição dos vinhedos ao sol, a constante ventilação, luminosidade e calor, aliados às mais modernas técnicas de vinificação, elevaram este vinho ao mais alto nível da enologia italiana.

Harmoniza perfeitamente com antipastos magros, massas, risotos e secondi piatti a base de peixe ou frutos do mar.



Offida DOC - outro rótulo "branco" que recebeu o selo DOC em 1999, este vinho, de coloração amarelo-palha, é produzido com uvas pecorino e passerina. Para aqueles que fizeram a associação com o queijo pecorino, feito com leite de ovelha, seu nome deve-se exatamente porque a uva Pecorino é plantada em áreas adequadas à pastagem destes animais. É ótimo com saladas e frutos do mar.

Rosso Conero DOCG - do solo calcário que se estende do Mar Adriático aos Apeninos saem também tintos de qualidade, a exemplo do Rosso Conero. A bebida, de um vermelho intenso, é comercializada após 2 anos de envelhecimento em barris de carvalho. Concilia com queijos staggionati, especialmente o pecorino di fossa.



Vernaccia di Serrapetrona DOCG - aqui temos um vinho de dupla fermentação, o mesmo procedimento utilizado para a criação dos espumantes. Sua produção somente é consentida em um território muito restrito, que compreende a comune di Serrapetrona e parte  dos campos que rodeiam as cidades de Belforte del Chienti e San Severino Marche, todos na província de Macerata.

É feito, ainda, na versão secco, considerado vinho de meditação, ou seja, fuori pasto (fora da refeição), mas acompanha bem assados de carne. Na tipologia dolce combina com biscoitos, tortas e doces secos.



Lacrima di Morro d'Alba - este tinto origina-se das videiras nativas das pequenas vilas ao norte do rio Esino, área montanhosa com encostas em direção ao mar. É despretencioso e consumido jovem.



Rosso Piceno - vinho tinto de sabor seco e aroma delicado, que provém do amplo território ao longo da costa sul, especialmente no entorno da cidade de Ascoli Piceno.

Primordial ressaltar que todos estes excelentes vinhos são bastante interessantes se levarmos em conta o custo-benefício. Geralmente seu preço varia entre  5 e  10 nos supermercados e cerca de 30% a mais nos pequenos negócios alimentari localizados nos centros das cidades marchegianas. Infelizmente nunca encontrei nenhum deles desde que retornei de viagem, mas creio que, caso um dia isto venha a ocorrer, certamente ficarei sobressaltado em conseqüência dos nossos sempre abusivos valores.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

TRATTORIA SPAGHETTERIA DA LASTRI - Boa, Bonita e Barata



Seria praticamente uma leviandade considerarmos Pisa somente como a casa do projeto arquitetônico que revelou-se terrivelmente equivocado, o mítico campanile di Santa Maria, mundialmente conhecido como a Torre de Pisa.

Erguida em terreno cujo subsolo é saturado de água, a torre do sino do Duomo da cidade, começou a inclinar-se imediatamente após a conclusão de suas obras, atingindo quatro metros e meio fora de seu eixo original (o que, convenhamos, somente conferiu maior destaque à cidade). Seu desvio contribuiu, entretanto, essencialmente para o desenvolvimento da física. Explico:

Aperfeiçoador do telescópio, inventado em 1607 pelo holandês Hans Lippershey, o astrônomo, cientista e físico Galileo Galilei utilizou-se do mesmo para realizar inúmeras descobertas ao longo de sua vida, tais como os satélites de Júpiter, os anéis de Saturno e a existência das manchas solares.

Ficou todavia famoso, sobretudo, em decorrência de sua lei da queda dos corpos. Considerando com cepticismo a teoria de que os corpos caíam com uma velocidade diretamente proporcional ao seu peso, o filho mais ilustre de Pisa realizou seguidos ensaios, nos quais derrubava objetos do alto da Torre Pendente, aproveitando-se de sua inclinação. Concluiu, assim, que a distância percorrida na queda aumenta na proporção do quadrado do tempo levado a percorrê-la.



A torre famosa é apenas um dos muitos haveres da Piazza dei Miracoli, centro histórico, artístico e turístico de Pisa, construído para ostentar o poderio desta cidade frente às mais influentes Firenze e Siena,  e que compreende outros monumentos - a Cattedrale di Santa Maria Assunta, o Battistero di San Giovani e o Camposanto monumentale - igualmente impressionantes e imortalizados nas diversas lojas de souvenires espalhadas no entorno da praça.



Pisa não é particularmente conhecida por possuir bons restaurantes ou uma cozinha própria marcante, então confesso que apostei na minha sorte ao não me preocupar em antever quais seriam as melhores possibilidades gastronômicas da cidade, o que é sempre temerário, uma vez que poderia acarretar em uma experiência desastrosa. Contudo, desta vez, meu final foi venturoso.

Sem imaginação e pernas, decidi-me por estacionar em algum estabelecimento próximo à Piazza dei Miracoli e defrontei-me, na vizinha Via Roma, com um seguimento de restaurantes, bares e cafés. Sabedor de que me encontrava em um centro turístico, optei pela casa que a mim figurou-se como a mais simpática. E assim cheguei à Trattoria da Lastri.



Estejam atentos, primeiramente, ao fato deste restaurante ter recebido algumas críticas negativas em sites especializados em turismo. Certamente não é nenhuma unanimidade, mas posso afirmar-lhes que tive um almoço despretencioso, econômico e aprazível no Lastri e, como opinião é um conceito relativo, embora respeite as de outros indivíduos, somente sinto-me apto a manifestar-me após viver minhas próprias aventuras. E, seja no quesito serviço, como nos ambiente ou comida, o Lastri jamais me decepcionou.



A decoração do Lastri é bem eclética, mas sem exageros e excesso de informação. Seu estilo mistura o rústico, de arcos e tijolos aparentes nas paredes,  ao clássico, com seu piso de mármore e cadeiras características do início do século passado. É simples, porém atraente e aconchegante.

Destaque para os potinhos de farmácia sobre a janela da cozinha, que conferem um ar caseiro ao lugar.



Sempre que tenho minhas descrenças no tocante ao restaurante em que me encontro, procuro não complicar, dando primazia ao que de mais básico a casa puder me oferecer. Com este pensamento em mente, fui de Gnocchi Bolognese 8 ), e não errei. Apenas meu apetite estava voraz, e este prato foi insuficiente para saciá-lo.



A belezura aí em cima, a Lasagna della Casa 7 ) tratou de resolver esta questão. Adorei! Massa macia, carne bem temperada, com molho béchamel, cremoso como poucos que já provei. Fosse aqui no Brasil, certamente custaria três vezes mais.

Alcanço, portanto, meu diagnóstico a respeito da Trattoria Lastri. Por toda má-fama que recebem os restaurantes de Pisa, ainda que este vise ao público turista, posso dizer-lhes que meu almoço esteve longe de ser ruim ou enfadonho. Aconselho para aqueles que pretendam aproveitar seu tempo visitando as atrações da cidade e que, em conseqüência disto, aspirem a uma refeição rápida e modesta.

ENDEREÇO:
Via Roma, 66, Pisa
Tel. +39 050 561908

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

RISTORANTE DA MEO PATACCA - O Paraíso dos Turistas em Roma

Havia um homem. Um policial, para ser mais exato. Todos os moradores daquele lado da cidade o conheciam e o cumprimentavam diariamente, tendo como retribuição seu sorriso amável e caloroso. Era muito respeitado.

Passavam das oito horas daquela noite. As ruas se esvaziavam rapidamente, na mesma proporção que a temperatura caía. A sensação de tranqüilidade e segurança trazidas pelo sol há muito tinha dado lugar ao bruxulear das luzes fantasmagóricas, característica marcante das ruas do Trastevere de 1920 após o anoitecer. As últimas portas de estabelecimentos comerciais fechavam-se estrondosamente. Aos poucos, as janelas dos lares exibiam diferentes cores e claridades e, em alguns pontos, já era possível sentir o aroma de comida caseira sendo preparada.

Como de hábito, nosso policial fazia sua rotineira patrulha noturna, com a mesma disposição e empenho de sempre. Mas havia algo diferente no ar, o que, é claro, não fugiu aos olhares curiosos dos moradores que ali se encontravam. É sabido que os policiais em Roma sempre circulam em duplas, mas, pela primeira vez desde que fora transferido para a circunscrição do Trastevere, ele achava-se desacompanhado. Por que? Ninguém sabia responder a esta indagação.

Depois, apenas descreveram que ele fora visto marchando por entre as labirínticas ruas do bairro, com passos firmes e ar determinado, até chegar ao estreito Vicolo de' Cinque, aonde adentrou em uma residência, para de lá nunca mais sair.

Sua esposa e filhos passaram meses, anos, esperando pelo seu retorno, que jamais aconteceu. Qual teria sido o destino de nosso protagonista? Qual a explicação para tão insólito epílogo da vida deste cidadão? Este denso mistério, ainda hoje, permanece sem solução.

Quando Michele, recepcionista do hotel no qual me hospedo ao visitar Roma, calou-se, permaneci cerca de dez segundos com meus olhos arregalados e sem piscar, tamanha era minha imersão na história que acabara de ouvir. Sempre fui um apaixonado por lendas e contos locais. Creio que enriqueçam uma viagem e dêem particularidade a uma cidade. E pensar que tudo começou com uma simples menção que eu fiz ao nome Trastevere.



O Trastevere fica na margem oeste do rio Tevere (Tibre, em português) e é o mais antigo e, porque não, um dos mais fascinantes bairros da capital italiana, com sua grande tradição histórica, fértil em eventos e anedotas, que sobrevivem na memória popular e tornam-se parte do encantador folclore romano. Destino e atração para turistas de todo o mundo, é, ainda, ponto de encontro para adolescentes e jovens romanos que ocupam as ruas do bairro durante toda a noite.

Hoje, o Trastevere é igualmente famoso pelos seus restaurantes, muitos dos quais lhe conferem um ar boêmio com suas mesas e cadeiras postas nas praças, ruas e esquinas.



Foi no coração do Trastevere que deparei-me com a belíssima Piazza dei Mercanti, sítio que outrora funcionava como sede para encontros de capitães, mercadores e proprietários de navios que se instalavam no porto vizinho de Ripa Grande.



Lá, estive em um restaurante super-lotado chamado Meo Patacca, ideal para quem procura um jantar divertido, acústico e teatral. Calma, irei explicar-me para que entendam.


Com sua iluminação ambiente à gás e velas, decoração característica, garçons em trajes de época e atmosfera de uma pitoresca pousada do início do século XIX, o Meo Patacca é um programa diferente e uma experiência única em solo romano. Aqui, conserva-se o espírito da Roma malandra e brincalhona.



Não se enganem, o Meo Patacca é, antes de tudo, uma aventura turística, especialmente se vocês resolverem tomar assento na área externa do restaurante. Prova disto, são os cantanti típicos que visitam todas as mesas, narrando chistes e bradando cantigas romanas.

Quando eu pensei "ok, é isso", eis que sou surpreendido pelo início de uma autêntica peça teatral. Do andar superior do prédio, surge uma linda mulher, debruça-se na sacada e começa a jogar beijos para os cantores. Estes, por sua vez, correspondem entoando melodias românticas para sua musa.

Vem à cena, então, o marido traído, pançudo, segurando uma frigideira e portando pijama (com gorrinho de dormir e tudo). Chega puxando sua esposa da sacada, para após gesticular e urrar em direção aos "mariachi", que apenas sorriem e divertem-se ao som de músicas de celebração.

Ao término da apresentação, os "atores" são agraciados com uma salva de palmas, vindas das diversas mesas do restaurante, todas apinhadas de turistas. A mesa contígua à minha era composta por italianos, mas acredito que também sejam viajantes. Sei lá, não consigo imaginar romanos nativos comendo lá. Não porque seja ruim - não é - mas por ser um programa voltado ao turismo.



Basta! Vamos, sem mais delongas, aos pratos! Comecemos, então, por este Ravioli alla Menta con Ragù Bianco d'Agnello e Pecorino ( € 14 ).

Por mais que eu aprecie determinados restaurantes especializados em cozinha italiana aqui no Brasil (poucos!), sempre me causa espanto a forma como os italianos cuidam de seus pratos em sua terra natal. A massa chegou al dente, com a quantidade suficiente de carne de carneiro e recheada de queijo de ovelha e folhas de menta. São ingredientes simples, mas que ficam incríveis quando unidos.


Após, submeti-me à um prato que há muito desejava provar, a Coda alla Vaccinara ( € 16 ). Obviamente rabada não é a comida mais bonita de se ver, mas no tocante ao sabor, que é o que realmente importa, passou no teste. Substanciosa, bem temperada e macia, a rabada não admite preguiçosos, já que exige trabalho considerável para desossá-la.

Nota importante: na Itália, os pratos não vêem à mesa, em regra, com contorni (acompanhamentos). É necessário solicitá-los separadamente, ou seja, somam-se mais alguns poucos euros na conta. Neste caso, pedi uma porção de Patatine Fritte ( € 5 ).



Agora, o momento festa infantil. Primeiro com uma fatia de Torta di Limone ( € 6 ), com massa molhada e ligeira, coberta com glacé e recheio azedo de limão...



... seguida por esta Torta di Gelato ( € 6 ) cheia de adornos e cores, super divertida de ver e comer. Senti o gostinho da minha infância a cada colherada.

Para quem não faz nenhuma questão de comer doces, até que eu estava uma formiguinha naquela noite. Acredito que eu tenha sido contaminado pelo ambiente vívido e sonoro do Meo Patacca (bem como pelo litro de vinho consumido). Afinal, quem era eu senão um turista no "Paraíso dos Turistas em Roma"?

ENDEREÇO:
Piazza dei Mercanti, 30, Roma
Horários: todos os dias, das 19:30 às 23:30
Tel. +39 06 5816198
http://www.ristorantedameopatacca.com/
Recomendam-se reservas